Nadia Murad, a iraquiana que ganhou o Nobel da Paz de 2018
Desde 1901 raríssimas mulheres ganharam o Prêmio Nobel. Todas dedicaram a vida ao bem-estar da humanidade. Nós, mulheres, queremos a Paz. A guerra não faz parte de nossos alvos. Procuramos a defesa, o bem-estar.
Em 2005 um movimento coletivo reuniu 1000 mulheres no mundo – era impossível escolher só uma – tantas trabalham pela Paz em seus países – e tentamos um NOBEL coletivo. Em 1000 Peace Women Across the Globe (www.1000peacewomen.org – estou nas pp. 709-710) estão as biografias e as fotos dessas mulheres. Do Brasil foram selecionadas 53, todas lutadoras em seus campos: brancas, negras, artistas, cientistas, políticas, indígenas, escritoras, e todas nós, também, donas de casa ( não se esqueçam). Além de nossas atividades profissionais, lutadoras pelos direitos das mulheres.
A história tem mostrado como os homens no poder priorizam a guerra, a luta pelo território, ampliação das fronteiras, a dominação econômica, a subordinação dos povos, a colonização. Há exceções, é claro, e é a eles que nós nos juntamos.
Ficou longamente esquecido que nós mulheres temos DIREITOS HUMANOS. Precisou um documento de 1993 da ONU para lembrar que, entre os direitos das mulheres, se deveria punir a violência contra elas. Viver sem violência era um direito! A subordinação era tão intensa que as mulheres tiveram de lembrar que “sim, somos seres humanos” e, quando agredidas, tem de haver punição por parte do estado.
Ao indicar Nadia Murad para o Prêmio Nobel da Paz alcançamos um novo patamar: o reconhecimento de que nossos corpos NÃO PODEM SER USADOS COMO ARMA DE GUERRA.
Nadia revela ao mundo que foi uma escrava sexual, que seu corpo não era considerado dela, mas pertencia ao vencedor de uma guerra suja. Ao ser subjugada à imposição sexual, isso significava que poderia gerar novos seres da etnia vencedora. Era e é o modo como os “vencedores” querem eliminar etnias e religiões dos opositores.
É o mesmo que dizer: esses corpos não pertencem às mulheres, elas são meros receptáculos, não são gente.
Nadia Murad superou a “vergonha” ao se tornar ativista dos direitos humanos e se revelar sobrevivente da escravidão sexual pelo Estado Islâmico no Iraque. Inimaginavel sua corajosa trajetória.
Sua coragem vem se somar a uma luta que nós travamos há anos: respeito à nossa identidade, respeito à nossa sexualidade, à diversidade, ao direito de decidir.
Almejo que esse prêmio alerte nossos futuros governos a criar espaços para que meninos e meninas respirem novos ares democráticos em todos os campos de suas vidas.
São Paulo, 5 outubro de 2018
Eva Alterman Blay
Eva Alterman Blay é professora titular sênior do Depto. de Sociologia e coordenadora do USP Mulheres