Desde março deste ano, quando o isolamento social foi adotado como estratégia para a redução do contágio pela covid-19, a Universidade de São Paulo conheceu uma realidade que nunca havia vivido. A partir de então, a maior parte do trabalho administrativo, das aulas e das atividades de pesquisa passaram a acontecer de forma exclusivamente virtual. A adaptação às ferramentas de videochamada, às novas rotinas de trabalho, e o próprio acesso à internet de qualidade tornaram-se prioridades da noite para o dia.
- Agravamento dos desafios pré-existentes
Por outro lado, questões sociais que antes da pandemia do novo coronavirus já mobilizavam esforços no Brasil, tornaram-se mais agudas durante o isolamento social. A diferença no tempo que homens e mulheres dedicavam ao trabalho doméstico, ao cuidado de crianças e adolescentes, de parentes mais velhos ou com alguma deficiência, já era de 8,1 horas semanais em desfavor das mulheres, de acordo com o IBGE (PNAD Contínua, 2019). A violência doméstica infligida por parceiros íntimos também já figurava como um grave problema, a par dos avanços obtidos com a instituição da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006). A menor remuneração das mulheres em relação aos homens em todas as posições hierárquicas, gerando maior vulnerabilidade econômica dessas, e a dificuldade no acesso a serviços de saúde da mulher – especialmente entre as mulheres negras – eram desafios já conhecidos na nossa realidade. Com a pandemia, esses fenômenos explodiram em todas os países, e órgãos multilaterais como a ONU Mulheres, passaram a alertar para a necessidade de se monitorar os cenários e desenhar ações de enfrentamento. A essas questões, somou-se o aumento nos casos de ansiedade, depressão e outros transtornos relacionados à saúde mental.
- Construindo um instrumento e uma rede de análise
Para entender essas questões no âmbito da comunidade uspiana, O Escritório USP Mulheres concebeu a pesquisa Impactos da Covid-19 entre as mulheres e os homens da USP.
Coordenado pela professora Maria Arminda do Nascimento Arruda – professora titular da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH/USP), coordenadora do Escritório USP Mulheres – e por Rodrigo Correia do Amaral – doutor em sociologia pela FFLCH/USP e responsável pela área de pesquisas do Escritório USP Mulheres – este estudo pretende observar como estudantes da graduação e da pós, docentes e servidores técnico-administrativos da USP, homens e mulheres, estão lidando com esta crise.
Em parceria com a Pró-Reitoria de Pós-Graduação, com a Pró-Reitoria de Graduação, com o Escritório de Saúde Mental (ESM), com o Escritório de Gestão de Indicadores de Desempenho Acadêmico (EGIDA) e com o Núcleo de Estudos da Violência (NEV), foi concebido um survey online que reúne questões relacionadas aos seguintes tópicos:
a) adaptação ao estudo e ao ensino virtuais, ao teletrabalho ou ao trabalho presencial indispensável (também denominado como essencial);
b) avaliação das horas dedicadas ao cuidado de menores sob a responsabilidade, de pessoas mais velhas e/ou com alguma deficiência;
c) impactos sobre a renda pessoal e a renda familiar no período;
d) acesso aos serviços de saúde no período, contato com a covid-19 em relação a si e aos familiares, e aspectos da saúde mental no período;
e) qualidade das interações externas e no ambiente doméstico;
f) perfil socioeconômico dos participantes.
Este questionário online e outras ferramentas para a análise dos resultados foram hospedados em máquinas virtuais (VM) obtidas pelo Escritório USP Mulheres junto à Superintendência de Tecnologia da Informação (STI/ USP). O projeto de pesquisa foi aprovado em novembro de 2020, junto ao Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo – CEPH-IPUSP (CAAE nº 39702920.0.0000.5561).
- Selecionando os participantes do levantamento
Em parceria com a PRG e a PRPG, a coordenação da pesquisa produziu uma seleção aleatória das alunas e dos alunos que seriam convidados a responder a pesquisa. Para isto, traçou um desenho amostral sobre a população de estudantes da graduação e da pós na USP, definido a partir da distribuição do gênero (masculino ou feminino) nos cursos de graduação e de pós-graduação.
Com o conhecimento da base de estudantes – preservadas as suas identidades – foi possível observar como em algumas unidades a proporção de mulheres, na graduação e na pós-graduação, restringe-se a 11% do total, enquanto em outras faculdades, escolas e institutos o inverso se dá em relação aos homens. Com isso, definiu-se pela realização de uma sobreamostragem desses indivíduos em minoria, com a adoção de um fator de correção que elevou em 70% a chance de seleção pessoas nessa condição (onde o gênero ao qual pertence não atinge 30% da população da unidade). A mesma fórmula foi adotada para seleção aleatória de docentes e servidores técnico-administrativos.
Deste processo, resultou uma amostra de 2.400 indivíduos sorteados de forma aleatória de uma base de 101 mil membros da comunidade uspiana. Essas pessoas foram convidadas a partir de um e-mail enviado pela coordenação da pesquisa, através da STI. A coleta de dados ocorrerá de 22/12/2020 a 10/02/2021.
- Debatendo os resultados com a comunidade
O Escritório USP Mulheres constituiu um comitê científico formado pelas instituições mencionadas (PRG, PRPG, ESM, EGIDA, NEV) e por especialistas que deverá, a partir de uma composição paritária de 1 mulher e 1 homem por órgão, discutir os resultados obtidos pela pesquisa a partir do mês de março de 2021.
Os resultados da pesquisa serão disponibilizados em relatórios técnicos e artigos científicos, e ainda por meio de uma plataforma interativa que permitirá ao público em geral combinar as suas variáveis de interesse. Esta plataforma, por sua vez, estará contida no Observatório USP Mulheres, um segundo projeto do Escritório que se encontra em elaboração e tem o lançamento previsto para o primeiro trimestre de 2021.
Dúvidas e esclarecimentos: pesqcovid19@usp.br